O transtorno do pânico é descrito pela Classificação Internacional de Doenças –(CID) nº 10 como um quadro clínico caracterizado por ataques recorrentes de ansiedade grave, imprevisíveis e irrestritos a qualquer situação ou circunstâncias particulares. De início súbito, caracteriza-se pela apresentação de sinais físicos como: palpitação; dor no peito; sensações de choque e tontura concomitantes à presença de sintomas psicológicos de medo secundário de morrer, de perder o controle ou ficar louco. As principais teorias que visam explicar o Transtorno do Pânico não são mutuamente exclusivas e envolvem causas psicossociais, físicas e genéticas. O mais comum é uma combinação de várias causas.
Embora não seja possível ainda determinar uma causa exata para o desenvolvimento do Transtorno do Pânico, podemos perceber que o estilo de vida contemporâneo em conjunto com outros fatores têm contribuído para o aumento progressivo de sua prevalência na população. Estima-se que, entre 2% e 4% da população mundial sofrem com o transtorno de pânico. A prevalência é maior nas mulheres, numa proporção de 2:1 em relação aos homens. Os primeiros ataques, geralmente, são vistos no final da adolescência e inicio da vida adulta.
Menezes (2005) aponta que o transtorno do pânico seria resultado da busca de defesa pelo indivíduo contra a situação de desamparo que o mundo atual apresenta. E quando o indivíduo é acometido pelo pânico, significa que ele não obteve êxito ao subjetivar o estado de desamparo.
O medo é o principal componente emocional do transtorno do pânico, embora seja uma resposta adaptativa da nossa espécie que nos alerta para a luta ou fuga. A resposta ao medo aparece de forma desajustada em pessoas com distúrbios de ansiedade, devido às suas percepções mal adaptativas frente a situações perigosas. É importante ressaltar que, expressões inadequadas de medo são as principais características dos distúrbios de ansiedade (BEAR; CONNORS & PARADISO, 2002).
Considerando a ansiedade o componente fundante do transtorno do pânico, podemos perceber que a forma com que a pessoa lida com a ansiedade influencia diretamente na instalação das crises de pânico. Os distúrbios de ansiedade são caracterizados por um grupo de sintomas emitidos pelo organismo diante de uma determinada situação. Dentre essas respostas emitidas pelo organismo é comum encontrarmos o aumento da pressão arterial e dos batimentos cardíacos; sudorese excessiva; agitação motora; rigidez muscular e alterações respiratórias.
O pânico do deus da mitologia
Pânico é uma palavra originária do grego Panikon, que faz referência ao deus Pã da mitologia grega. Das diversas versões contadas sobre o mito, algumas contraditórias, outras complementares, podemos resumidamente apresentar que Pã significa Tudo = natureza fecunda e criadora; um ser que vivia nas florestas, assustava as pessoas e que foi abandonado pela mãe sendo considerado uma vergonha para o pai, além de ser rejeitado pelas ninfas.
Segundo a mitologia grega, Pã era o deus dos bosques e dos pastos, protetor dos pastores que veio ao mundo com chifres e pernas de bode. Era considerado o mensageiro dos deuses, pois era responsável por estabelecer a transição entre os deuses de forma humana e os de forma animal.
Pã foi abandonado por sua mãe logo no nascimento, assustada com sua forma estranha, uma vez que ele tinha pés de bode, chifres na testa e barba. Quando seu pai o levou ao templo, reza a lenda que todos do Olimpo ridicularizaram a criança. Em vista disto, seu pai lhe pediu que nunca o chamasse de pai. As ninfas zombavam incessantemente de Pã em virtude do seu rosto repulsivo. Logo, seu destino era amar sem nunca conseguir se unir à criatura amada. Pã era temido por todos aqueles que necessitavam atravessar as florestas à noite, pois as trevas e a solidão da travessia provocavam pavores súbitos, desprovidos de qualquer causa aparente, mas que eram atribuídos a Pã – daí o nome pânico.
Analisando o mito, é interessante notar que Pã vivia uma contradição em relação à sua condição de deus à medida que esta não lhe conferia o status esperado, muito pelo contrário, foi rejeitado pela mãe, por não ser do jeito que ela gostaria e esperava, passando a maior parte do tempo sozinho, sem o pai com quem contar, sofrendo humilhações das ninfas e desprezo dos demais amigos do pai. Logo, podemos levantar algumas hipóteses que nos apontam para a escolha de seu nome como referência para o transtorno do pânico: não apenas pelo fato de assustar as pessoas nas florestas de maneira abrupta, mas principalmente, por ser um modelo que representa aqueles que vivenciam experiências que estão por detrás dos sintomas aparentes do quadro de transtorno de pânico. Desse modo, apesar dos sintomas serem assustadores assim como a própria figura do deus Pã aparecendo de súbito nas florestas, a experiência da rejeição, da solidão e da humilhação pode provocar emoções e sentimentos muito mais aterrorizantes para quem os vivencia, podendo assim, desencadear reações de medo e pavor levando a um mal estar físico e psíquico incontrolável que desespera e paralisa.
Portanto, podemos perceber que a origem e a trajetória do mito são marcadas por relações afetivas carregadas de emoções negativas e experiências relacionais de abandono, rejeição e desamparo. Segundo Fonseca Filho (1980), de acordo com as experiências relacionais, teremos uma moldagem psicológica como resultante das cargas de vivências positivas e negativas. Sendo que “a carga afetiva básica do ser humano é o amor e sua carga oposta o desamor, rejeição”. (FONSECA FILHO, 1980, p.105)
A teoria da ligação (Bowlby,2006) sustenta que o ser humano tem forte tendência a estabelecer vínculos afetivos com os outros, e, que diante de uma separação pode reagir com um profundo abalo sentimental que inclui ansiedade, raiva, depressão e desligamento emocional. Assim, os aprendizados propiciados pelos vínculos relacionais determinam a forma como lidamos com as emoções e os sentimentos. Sendo as emoções e os sentimentos elementos fundantes de diversos transtornos mentais, dentre eles, o transtorno do pânico.
Durante uma crise de pânico a pessoa se encontraria então totalmente mobilizada pelas emoções, em contato com o estado fisiológico hiperativado, com sensações físicas descontroladas, sem acesso à mente racional como via de controle da emoção, com baixo potencial espontâneo, sem acesso ao depositório de respostas prontas, produto das conservas, que nesse caso, corresponde à mente racional, que deveria ser nesse momento, uma aliada na busca da criatividade e do equilíbrio para enfrentar a situação.
A partir do perfil da maioria da população atingida pelo transtorno do pânico que se caracteriza por ser constituída de pessoas extremamente produtivas que costumam assumir uma carga excessiva de responsabilidades e afazeres; muito exigentes consigo mesmas, que não convivem bem com erros, ou, imprevistos; com tendência a se preocuparem excessivamente com problemas cotidianos; com alto nível de perfeccionismo, excessiva necessidade de estar no controle, e de aprovação; auto-expectativas muito altas, pensamento rígido, competente e confiável; que reprimem a maioria, ou todos os sentimentos “negativos”, podemos notar que são pessoas que tendem à privação afetiva, à dependência emocional e à passividade nas relações interpessoais.
Temos então, um perfil de pessoas que utilizam respostas conservadas de maneira rígida, que impedem o acesso à espontaneidade, favorecendo assim, a instalação da ansiedade e, consequentemente, sua evolução para as crises de pânico.